Por Joseph Le Page
Um dia, os habitantes do Planeta Purusha ouviram falar de um planeta distante chamado Prakriti, onde era possível conhecer a si mesmo em um mundo de dualidade, vivendo como um ser individual, cada um com sua própria identidade.
Este mundo de dualidade poderia ser percebido através dos cinco sentidos: audição, tato, visão, paladar e olfato. Ao visitar Prakriti, os cidadãos de Purusha poderiam continuar sentindo toda paz e alegria, e ao mesmo tempo também conhecer a si mesmos. Após essa jornada de investigação e aprendizagem, retornariam para casa mais conscientes de sua identidade real – cidadãos do Planeta Purusha.
Para viajar para o Planeta Prakriti, o povo de Purusha precisava de aeronaves especiais que pudessem resistir à atmosfera de Prakriti. Então, construíram aeronaves dos mesmos cinco elementos que compunham o Planeta Prakriti: terra, água, fogo, ar e espaço.
Cada aeronave foi construída artesanalmente, com características particulares que seguiam três modelos básicos chamados Vata, Pitta e Kapha.
As aeronaves Kapha eram densas e sólidas; as aeronaves Pitta eram possantes e perfeitas; e as aeronaves Vata eram leves e rápidas.
Cada aeronave era constituída de três componentes básicos: a estrutura da nave em si chamava-se corpo físico, o piloto responsável por dirigir a nave chamava-se mente, e o passageiro principal chamava-se alma, o espírito que leva consigo a essência da felicidade e completude do Planeta Purusha.
A ida para o Planeta Prakriti e a volta para Planeta Purusha seria possível somente através da integração completa de Corpo, Mente e Espírito.
Antes de sair para a jornada ao Planeta Prakriti, os habitantes do Planeta Purusha instalaram uma potente antena transmissora para que eles pudessem sempre manter contato com seu Planeta. Essa antena chamava-se Mahat, que significa “o Grande”. Cada aeronave tinha também um computador de bordo super-inteligente, chamado Buddhi, que quer dizer inteligência suprema, para garantir que o piloto da nave sempre tivesse em contato com o Planeta Purusha.
Todas as aeronaves partiram de Purusha ao mesmo tempo, mas cada uma teve sua trajetória única. As aeronaves Kapha, pesadas e lentas, seguiram a viagem em um ritmo constante. As aeronaves Pitta, concebidas para ter um desempenho perfeito, às vezes perdiam tempo em detalhes desnecessários. As aeronaves Vata fizeram a viagem mais emocionante, explorando diferentes universos e planetas, mas muitas vezes esqueciam onde tinham deixado as chaves e perdiam muito tempo procurando. Mas no fim da viagem, todas as aeronaves chegaram ao Planeta Prakriti ao mesmo tempo.
Ao se aproximarem de Prakriti, os pilotos prepararam os equipamentos e as ferramentas necessárias para a tão esperada temporada de exploração. Um conjunto de equipamentos chamado de jnanaendriyas servia para receber informações no Planeta Prakriti. Jnanaendriya quer dizer ferramentas para obter conhecimento no idioma do Planeta Purusha, chamado sânscrito. Os jnanaendriyas constituem os cinco sentidos: audição, visão, olfato, paladar e tato. Havia também equipamentos chamados karmendriyas, que permitiam que cidadãos de Purusha pudessem executar ações no Planeta Prakriti, tais como falar, se movimentar, pegar objetos, eliminar resíduos da nave, e até mesmo procriar novas “naves-bebês”. Com todos estes equipamentos, nada poderia atrapalhar a viagem de investigação e autoconhecimento no Planeta Prakriti.
Ao chegarem na atmosfera do Planeta Prakriti, as naves atravessaram uma série de tempestades inesperadas, repletas de turbulência, chamadas tempestades rajas, que quer dizer forte turbulência. Também atravessaram intervalos de calmaria, chamados tamas, onde nada se movia. Esses ciclos de rajas e tamas eram intercalados com breves momentos de equilíbrio perfeito chamados sattva, quando a viagem fluía bem, sem qualquer esforço.
Todas as aeronaves finalmente aterrissaram no Planeta Prakriti, mas a viagem foi muito estressante. A maioria dos pilotos ficou com amnésia crônica, esquecendo sua missão original de exploração e autoconhecimento. Esses pilotos ficaram deslumbrados com as experiências do Planeta Prakriti, não mais se lem-brando de sua identidade original como cidadãos do Planeta Pususha. Os sistemas de comunicação inteligentes, buddhi, ficaram enferrujados por falta de uso, e sem buddhi funcionando adequadamente, os pilotos perderam contato com a Grande Antena Mahat, e consequentemente com o Planeta Purusha.
Com o passar do tempo, os cidadãos de Purusha passaram a acreditar que eram cidadãos do Planeta Prakriti, com personalidades próprias. Passaram a pensar que estavam em Prakriti apenas para desfrutar das vitrines dos diversos shoppings, andando em círculos, consumindo combustível e reproduzindo navezinhas. Esta condição de amnésia se chamava de avidya e este círculo vicioso de avidya denominava-se samsara.
No entanto, alguns poucos pilotos continuavam se lembrando da sua verdadeira cidadania e missão. Eles eram chamados de Rishis ou videntes e tinham a capacidade de ajudar os pilotos-esquecidos a saírem do padrão de tráfego circular do Planeta Prakriti e voltarem a se reconhecer como cidadãos do Planeta Purusha. Aqueles que decidiram retornar à sua identidade original precisavam primeiro consertar suas naves devido ao estresse crônico que sofreram com o uso excessivo dos jnanaendriyas e karmendriyas.
Os reparos eram realizados em oficinas que utilizavam uma ciência chamada Ayurveda, especializada em reequilibrar os cinco elementos, matéria-prima das naves. Às vezes, os sistemas das naves estavam tão entupidos e desequilibrados que ti-nham que passar por um serviço de limpeza completo chamado Panchakarma. Depois das naves terem passado por esse tratamento completo, sentiram a necessidade de ter em mãos um manual de instruções que os guiasse no caminho de volta à Purusha. Um dos mais conhecidos e eficientes manuais de retorno foi aquele compilado por um sábio chamado Patanjali. O nome do manual chamava-se Ashtanga Yoga, um manual que continha os Oito Passos de retorno à Purusha, descritos a seguir:
Os dois primeiros passos, Yama e Ni-yama, descreviam como os pilotos deveriam se comportar na viagem de volta.
O terceiro passo, chamado Asana, era necessário para assegurar que as estruturas das aeronaves permaneceriam estáveis e firmes para que a viagem fosse confortável e segura.
O quarto passo, Pranayama, dava as instruções sobre o adequado abastecimento e distribuição de energia durante a viagem.
O quinto passo, Pratyahara, consistia em remover a atenção dos pilotos de todas as distrações do Planeta Prakriti, para que pudessem se concentrar na missão de volta ao Planeta Purusha.
O sexto passo, Dharana, estabelecia uma direção certa e contínua, rumo ao Planeta Purusha.
O sétimo passo, Dhyana, ou meditação, descrevia um estado ideal de vôo no qual todos os sistemas das naves (corpo, mente e espírito) estariam funcionando de forma integrada, guiados por Buddhi, em contato cons-tante com Mahat, mantendo de forma contínua uma comunicação clara com Purusha.
Através deste Manual dos Oito Passos de Patanjali, muitas naves puderam voltar para casa, e quando chegaram, reassumiram sua verdadeira identidade como cidadãos do Planeta Purusha, retornando para um estado de perfeita união, chamado Samadhi, o último passo.
Ao voltarem, no entanto, os cidadãos de Purusha já não eram mais os mesmos de quando haviam partido. Agora, esses cidadãos de Purusha possuíam a experiência do espelho do autoconhecimento. Eles conheceram o Planeta Prakriti, o mundo da dualidade, e então, retornando ao Planeta Purusha, tornaram-se plenamente conscientes de sua natureza intrínseca de paz e completude.
O aprendizado mais profundo dessa viagem, que é a jornada de todos aqueles que trilham o caminho do Yoga, é que Purusha e Prakriti são, na realidade, um só planeta, e que nós podemos viver a vida em estado de Purusha em meio ao mundo de Prakriti.